Práticas teatrais NA EDUCAÇÃO DO SENSÍVEL
EVELIN SUCHARD¹; ADRIANA NUNES²; MARIA AMÉLIA GIMMLER NETTO³
¹Universidade Federal de Pelotas - evelin_suchard@hotmail.com
²Universidade Federal de Pelotas - dricanuness@hotmail.com
³Universidade Federal de Pelotas - mamelianetto@gmail.com
1. INTRODUÇÃO
Este texto visa analisar e relatar a percepção entre as discussões ocorridas
na elaboração de nossa oficina “Sentidos: sentindo o corpo docente”, que foi
preparada pelos bolsistas do Programa de Iniciação à Docência (PIBID) do Curso
de Teatro-Licenciatura da UFPel, no ano de 2014. Esta oficina visava trabalhar,
através de exercícios teatrais, a sensibilização para a vivência em sala de aula
dos estudantes de licenciatura, professoras supervisoras e coordenadoras das
escolas onde o subprojeto do PIBID Teatro está inserido e os diferentes
resultados obtidos através de sua prática. Ao lermos o texto de Rubem Alves
"Educação dos sentidos", sentimo-nos impulsionados a entender esse processo
de educação dos nossos sentidos e até mesmo buscar provocá- lo através do
teatro, ligando o estudo teórico à demanda do subprojeto em oferecer uma oficina
de teatro aos pibidianos das diferentes áreas. Nas discussões, apareceram
relatos sobre a pressa do dia-a-dia e observações sobre a qualidade do sentir das
pessoas e da suas próprias vidas que poderia estar se perdendo.
Analisaremos a oficina como um todo, desde sua elaboração até seus
diferentes resultados, tendo em vista que a oficina não se limitou a ser ministrada
apenas para pibidianos de escolas pontuais que recebem bolsistas pibidianos do
Curso de Teatro e expandiu-se para o Encontro geral do PIBID UFPel- Avaliando
e Superando os Desafios da Docência e para a disciplina “Comunicação em
Saúde” do Curso de Farmácia da UFPel, entre outras oportunidades, a fim de se
entender, principalmente, os possíveis efeitos desse desenvolvimento do sentir,
por meio de fundamentos da arte teatral, trabalhados para públicos distintos com
diferentes objetivos.
A questão que nos guiou no decorrer de todo o processo foi: Qual a
importância e necessidade de percebermos nosso corpo, de senti-lo em sua
totalidade como participante de um processo de aprendizagem?
2. METODOLOGIA
Com o inicio das novas atividades do PIBID-Teatro UFPel em maio de
2014 foi organizado o cronograma de estudos teóricos necessários para o
aprofundamento das atividades disciplinares previstas no subprojeto. Com o
ingresso de novos bolsistas de diferentes semestres do curso, fez-se necessário
primeiramente o estudo dos PCNs e OCNs, (Parâmetros Curriculares Nacionais e
Orientações Curriculares Nacionais) assim como a leitura do projeto do PIBID e
do subprojeto do PIBID Teatro, além da realização de seminários sobre as leituras
realizadas.
A partir do inicio do segundo semestre, já pensando em fundamentação
teórica para a criação da oficina a ser oferecida ainda no mesmo ano como
atividade disciplinar da área de teatro, iniciamos a leitura dos textos "Educação
dos Sentidos" de Rubem Alves e "A Montanha e o Videogame" de JoãoFrancisco
Duarte Jr. Após a leitura individual de cada texto pelos bolsistas, foise discutido
em reunião de área, realizada semanalmente, os pontos pertinentes da leitura de
cada um e feita uma reflexão geral acerca do que cada texto aborda. Na busca
por englobar as percepções com o estudo teórico em uma oficina que
efetivamente fizesse com que esse "sentir" do corpo e a importância que ele tem
na postura de um professor, escolhemos os jogos que acreditamos ser os mais
adequados aos nossos objetivos.
Os jogos selecionados para a elaboração da oficina prática foram retirados
do livro "Jogos para Atores e Não-Atores" de Augusto Boal de uma classificação
para se trabalhar os sentidos, selecionados previamente como material de estudo
complementando as leituras já feitas acerca da educação do sensível. Os jogos
citados a seguir foram os selecionados pela equipe de bolsistas: Bons-Dias
(BOAL, 2002, pg 118); Odor das Mãos (BOAL, 2002, pg 162); Floresta de Sons
(BOAL, 2002, pg 155); A Máquina de Ritmos (BOAL, 2002, pg 129) e A Menor
Superfície (BOAL, 2002, pg 93). Pensando em um jogo simples que explorasse o
paladar, não contemplado nos jogos propostos por Boal, o grupo de bolsistas
criou um jogo que foi chamado de Rosto e Gosto, na qual os participantes são
divididos em dois grupos, o que realiza a atividade e o que observa, alternando a
função dos grupos, onde um determinado número de participantes experimenta
variados sabores e o restante observa e tenta adivinhar através da expressão
demonstrada por quem degusta, quais são as possibilidades de sabores
vivenciados ou até mesmo descobrir exatamente o gosto que foi provado pelo
colega. A previsão de duração para o desenvolvimento da oficina ficou no período
de três horas.
Com a oficina elaborada, partimos para a organização de sua aplicação em
escolas onde bolsistas organizados em trios ou em duplas, estavam atuando.
Ficou determinado que a oficina deveria ocorrer entre final de outubro e início de
novembro, preferencialmente no dia de reunião interdisciplinar que ocorria em
cada escola. O PIBID Teatro, na ocasião, atuava em quatro escolas, sendo elas:
Dr. Augusto Simões Lopes; Institituto Estadual de Educação Assis Brasil; Escola
Técnica Estadual Prof Sylvia Mello e Colégio Estadual Felix da Cunha e o
cronograma da realização da oficina foi planejado respeitando o andamento de
atividades de cada escola. Após a realização da oficina em cada escola, discutiuse
em reunião disciplinar as dificuldades e percepções, afim de que pudesse ser
aprimorado o plano e seu desenvolvimento prático.
As bolsistas autoras deste texto relatarão as novas percepções que
puderam ser obtidas com a realização da mesma oficina acima citada para dois
públicos-alvos diversos. Uma delas terá foco na aplicação do plano de aula
elaborado para os participantes do evento geral do PIBID, em que participavam
licenciandos de diversas áreas de conhecimento. A outra enfocará a experiência
de aplicar o mesmo plano de aula já citado para estudantes da área da saúde em
disciplina ministrada pela professora Maria Cristina Werlang “Comunicação em
Saúde”, momento em que os bolsistas do PIBID Teatro tiveram a oportunidade de
ministrar a oficina para uma turma de estudantes do Curso de Farmácia da
UFPel.
3. RESULTADOS E DISCUSSÃO
Nota-se a diferença da primeira aplicação da oficina para as que foram
ministradas posteriormente a partir de um mesmo plano de aula, pois naquela
ocasião existia a ansiedade de saber se o plano iria funcionar realmente. A cada
oficina aplicada para grupos diversos e com objetivos diferentes, os pibianos
ministrantes sentiram-se mais apropriados dos exercícios, o que foi fazendo com
que os mesmos ficassem cada vez mais dinâmicos e fluídos. Identificamos estas
características como um reflexo da segurança adquirida com as experiências
vivenciadas pelos bolsistas, o que nos faz pensar novamente na oportunidade
que o projeto nos proporciona em vivenciar práticas da docência que são tão
efetivas para uma completa formação dos estudantes da licenciatura.
A partir da proposta de que cada área de conhecimento oferecesse uma
oficina no evento “II Seminário do PIBID - UFPEL: Avaliando e superando
desafios da docência” realizado em Pelotas nos dias 02 e 04 de dezembro de
2014 decidiu-se aplicar o plano de oficina elaborado para que mais pibidianos
pudessem conhecer nossa linha de trabalho. Os ministrantes dividiram-se em dois
grupos e neste dia, metade aplicou a oficina na parte da manhã e a outra metade
na parte da noite. Pelo fato dos pibidianos já haverem ministrado a mesma oficina
em locais e grupo diferentes, a partir da experiência de aplicação nas escolas,
algumas adaptações ao plano original ocorreram, como por exemplo, o jogo rosto
e gosto que ganhou mais dinamismo sendo executado com mais de uma pessoa
experimentando os sabores, diferente da forma com que alguns haviam aplicado
em suas escolas de origem, quando apenas uma pessoa experimentava
enquanto todas as outras assistiam e prestavam atenção nas reações dos
colegas, tentando adivinhar o que havia sido ingerido. Nesta ocasião o jogo não
se demorou tanto tempo como anteriormente e mais pessoas puderam participar
da parte degustativa.
Outra modificação feita foi em relação ao fato de que o grupo de alunos da
oficina, seria composto por pibidianos de diferentes cursos de licenciatura da
UFPel e atuantes em deferentes escolas que sediam o programa. Eles não
tinham ligação direta de conhecimento e isso fez com que houvesse alterações no
plano de aula, principalmente o inicio, em que foi colocado um exercício de
apresentação pessoal e outro de interação grupal, para todos integrantes já
interagirem uns com os outros. Já durante a apresentação, pode-se perceber os
participantes bem animados, integrados entre si e inclusive com os pibidianos
ministrantes. Os exercícios fluíram bem e apesar de ter ocorrido uma prévia
divisão entre os responsáveis por cada jogo, no momento de pôr em prática o
plano de aula estavam todos tão à vontade que a condução da oficina ocorreu de
forma colaborativa. Essa segurança com a oficina foi provavelmente um dos
principais fatores para a realização proveitosa da mesma, juntamente a
disponibilidade dos participantes, que deram retorno positivo ao final. Enquanto
discutíamos a importância de momentos assim, que valorizem a presença
individual e às relações grupais em que realmente sentimos e vivemos os
momentos de trocas de aprendizados por meio do corpo sensível e,
principalmente, o quanto esse tato é importante de ser observado em sala de
aula. O evento foi uma das últimas atividades do semestre e encerrou o ano de
2014 e já no inicio de 2015, com a volta das reuniões de área, surgiu um novo
convite, mas dessa vez para um público diferente do que era de costume.
Até então as oficinas só haviam sido aplicadas para licenciandos pibidianos
e professores supervisores e coordenadores, ou seja, sempre se estava no
campo da formação em educação. Mas dessa vez a oportunidade surgiu por parte
de uma professora do Curso de Farmácia. Essa oficina foi ministrada pelas
bolsistas Evelin Suchard, Cibele Fernandes e Anderson Morais. Como feito
anteriormente no seminário, realizou-se primeiramente uma apresentação entre
todos participantes e ministrantes da oficina, apesar de muitos já conhecerem-se,
por serem colegas, julgou-se necessário, como forma de aproximação, também,
entre todos os que se encontravam ali presentes, mas diferente do seminário, não
utilizou-se jogo de apresentação, mas sim a própria fala, como forma de fazer
com que eles se sentissem disponíveis antes de realmente partir para a ação.
Antes de começar-se o jogo dos bons dias "Jogo útil especialmente para
iniciar espetáculos de Teatro-Fórum, aquecendo a platéia: cada pessoa deve dar
bom-dia ou boa-noite a uma outra e dizer seu nome, não podendo largar a mão
dessa primeira pessoa antes de apertar a de uma outra, para dar bom-dia ou boanoite,
e assim por diante, formando-se redes de aperto de mão" (BOAL, 2002, pg
118), resolveu-se adicionar o jogo "Teia" que consiste em todos os participante
formarem um circulo, dando as mãos aos colegas ao lado, marcando na memória
para quem está dando a mão direita e para quem está dando a mão esquerda,
depois todos soltam-se e andam pelo espaço, até que em um certo momento,
quem está guiando a brincadeira pede parar todos os jogadores pararem no lugar
e encontrar as mão das duas pessoas que estavam anteriormente, se movendo o
mínimo possível e posteriormente tentando voltar ao circulo, é um jogo que
reforça o trabalho em equipe, servindo como forma de interação, ao mesmo
tempo em que envolve esse toque de mão e serve também para a concentração,
pois enquanto os participantes tentam desenrolar a teia de braços, eles
concentram-se sem nem perceber.
A oficina aconteceu de forma bastante dinâmica e fluida, os ministrantes
estavam bem seguros e dessa vez nem se atribui a condução dos exercícios por
cada ministrante individualmente, o grupo todo conduziu em conjunto e auxiliou a
execução deles por parte dos participantes. Durante a condução dos exercícios já
surgiram questões sobre as percepções sensoriais dos participantes, que
estavam percebendo os sentidos e ligando às suas formas de abordagem para a
sua área de conhecimento que é o campo da saúde. Ao final, durante a
discussão, surgiu nitidamente essa necessidade que os estudantes da área da
saúde têm, de trabalhar mais as relações humanas desta forma física e baseada
nas relações grupais. Vivencia que, por unanimidade, foi considerada por eles
essencial à sua formação
4. CONCLUSÕES
A cada parágrafo que ia sendo escrito relembrávamos de cada experiência.
Fazer uma reflexão e conseguir concluir idéias e percepções que nos tocam em
todos os sentidos e nos enchem a face de alegria ao desenvolver um trabalho que
tem no título "sentidos" e "sentindo" se torna difícil ao momento que só nos vem a
conclusão que o contato com o "despertar" de corpos não acostumados com a
prática teatral, que vê-los distanciar-se das inúmeras atividades que um
acadêmico de uma universidade pública tem e não perceber-se que quando se
verifica as horas já se passaram e não sentiu-se.
“Despertar dos sentidos” é a “palavra mágica” que encontramos para definir
o que aconteceu durante esse contato entre estudantes de cursos universitários
diferentes, com entendimentos tão diversos sobre o "sentir" seu corpo e suas
capacidades relacionais. É preciso desprendimento de certezas pré-estabelecidas
e dedicação para se envolver em uma prática corporal para se pensar e mesmo
sentir o corpo, que nos é instrumento de trabalho para a profissão. O professor
não usa apenas do seu intelecto para desenvolver uma aula, ao ministrá-la ele se
depara com ter que saber usar a voz, para que os estudantes percebam o que ele
diz, depare-se às vezes em ter que usar o corpo todo para que possa fazer-se
entender.
A troca que ocorreu entre ministrantes da oficina, estudantes do Curso de
Teatro-Licenciatura e estudantes de outras áreas de conhecimento da UFPel, que
muitas vezes não tem a oportunidade de pensar no corpo da como o entendemos
em nosso Curso, foi elementar para que pudéssemos pensar a educação para
além do intelecto. Também para pensarmos que vamos educar pessoas, com
histórias de vida complexas, com experiências que desconhecemos e que cabe a
nós saber aproveitar o melhor que essas pessoas trazem em seus corpos. Se
pretendemos expor nosso conhecimento à determinadas pessoas a sabedoria do
corpo sensível se oferece como material que se estende para além do
reconhecimento de nossos alunos, mas se apresenta como base para o despertar
da inteligência de nosso corpo, como profissionais que trabalham com educação
e com arte.
5. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
ALVES, R. Educação dos sentidos e mais. Campinas/SP: Verus Editora, 2005.
DUARTE JÚNIOR, J. F. A montanha e o videogame: Escritos sobre a
educação. Campinas/SP: Papirus Editora, 2010.
BOAL, A. Jogos para atores e não-atores. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira,
2002.
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